quarta-feira, 11 de maio de 2011

#Meus Trapos IV - Spoilers de um passado, Parte II


[O Texto que se segue é a continuação do Spoilers de um passado, Parte I]

Eu não acreditei quando me contaram. Sim, já tinha encontrado algo suspeito, mas não tão suspeito, ou melhor dizendo não completamente insuspeito. Mas sempre que via algo anormal tentava arranjar desculpas por mim mesma. Porquê? Porque escolhi acreditar que eram coisas leves. Um interesse passageiro. Uma ou outra vez para ‘dar pica’. Porque escolhi acreditar nele quando lhe perguntava e ele negava. E ele mentiu-me.
Desde que nos conhecemos, ele só me tinha mentido uma vez. E nesse dia eu virei-lhe as costas e nunca mais lhe dirigi a palavra. Ele conhecia-me. Ele sabia o quanto eu valorizava a honestidade. E agora via que ele tinha voltado a mentir-me.
Mas eu não conseguia mexer-me. Eu não conseguia nem desviar o olhar daquilo. Eu sentia raiva. E eu ainda não sabia se era por ele ter-me mentido ou se era por eu ter escolhido acreditar na mentira. Talvez fosse os dois. Mas a raiva cresceu e quando dei por mim estava a atirar aquilo contra a parede com todas as minhas forças.
Os soluços pararam e o seu olhar encontrou o meu. E desta vez eu reparei nas pupilas totalmente dilatas, mas o medo que eu vi no seu rosto coberto de lágrimas levaram a raiva para longe. E uma tristeza enorme tomou conta de mim. Ele era o meu herói. Ele sempre foi. A levar-me ao colo, às cavalitas, a fazer-me morrer a rir com cócegas ou o seu humor divertidíssimo. Ele era o “Meu Rapaz”. Ele era o Meu porto de abrigo. Ele era o irmão que nunca tive. Ele era o Meu melhor amigo. Mas agora eu não via nada disso. Agora eu via um menino aterrorizado, com medo de ser levado por sei lá eu quem e que olhava para mim com grandes olhos escuros e tingidos de vermelho. E eu não pensei mais.
Peguei na cadeira que ele tinha atirado ao chão e coloquei-a a bloquear o manípulo da porta. E fui sentar-me ao seu lado no canto do quarto. Ele encostou-se a mim e eu abracei-o aconchegando-o no meu peito.
– Pronto, – Disse enquanto lhe afagava o cabelo. – Eles não vão entrar. E mesmo que tentem, ninguém te vai levar.
Ele levantou a cabeça e olhou directamente nos meus olhos, como uma criança olharia se lhe dissesse que o Pai Natal está a chegar. – Prometes?
E isso foi tudo, não importa o quanto eu tivesse me esforçado para que as lágrimas não saíssem, uma lágrima rolou pelo meu rosto. E ele muito gentilmente, assim como tinha feito tantas outras vezes, limpou-a com o seu dedo.
– Prometes? – Ele repetiu.
– Prometo. Ninguém te tira de ao pé de mim. – Eu respondi com um leve sorriso voltando ao meu rosto. Pois naquele pequeno gesto eu vi que Ele, o “Meu Rapaz”, ainda lá estava. 

Fim.

Foto e Texto por: Siri Ahcor

sábado, 7 de maio de 2011

#Meus Trapos III - Spoilers de um passado, Parte I


Eu entrei no quarto, e mal me virei após fechar a porta deparei-me com ele parado mesmo a minha a frente. No rosto tinha a expressão mais assustada que algum dia vi.
– São eles! Eles! Eles vêm buscar-me! – Agarrou-me nos ombros e trouxe o seu rosto para próximo do meu. – Temos de fugir! Eles vão levar-me! Eles vão fazer coisas comigo. Eu não quero! Não quero!
Eu não sabia o que o estava a atormentar tanto. Eu não entendia o porquê de tanto medo.
– Hei. Calma. – Peguei-lhe nas mãos, que tremiam descontroladamente, e guiei-o até a cama onde o sentei ao meu lado. – Diz-me o que se passa, mas devagar, se não eu não vou entender.
– São eles! Eles querem levar-me e fazer-me mal. – Fechou os olhos bem apertados e desta vez todo o seu corpo tremeu, – eles vão fazer-me coisas horríveis. Eles são maus! Eles são tão mãos. Eles estão lá fora, vieram buscar-me –
– Não está ninguém lá fora. Eu vim de lá. Não está lá ninguém. – Ele ainda não tinha aberto os olhos e com as minhas mãos no seu rosto obriguei-o a olhar para mim. – Não está lá ninguém. Se quiseres pudemos ir lá ver.
– NÃO! – Ele afastou os meus braços e correu para o canto do quarto mais afastado da porta, deitando uma cadeira ao chão no processo.
Sentou-se no chão e abraçou as pernas, pondo a testa nos joelhos. E assim numa bola ele tremia e abanava-se para a frente e para traz murmurando algo incompreensível entre soluços abafados. Como um menino assustado com medo do bicho papão.
Eu não sabia o que fazer. Um sentimento de impotência enorme me preenchia e a falta de entendimento não melhorava o facto de estar ali como uma inútil. Eu nunca o tinha visto assim, e no momento estava tão assustada que passava-me tudo pela cabeça, desde ataques de Aliens a associações de crime organizado. Mas nunca me passou pela cabeça o que eu tinha ouvido, o que me tinham contado, o que tantas vezes lhe perguntei e ele negara.
Nunca, até que ao observar o quarto o meu olhar se deteu numa taça de vidro ao lado da televisão. E eu gelei. Um grande balde de água gelada pareceu escorrer do interior do meu peito até aos meus pés. O coração caiu-me aos pés e espatifou-se quando qualquer réstia de esperança se espatifou com ele.

Continua...

Foto e Texto por: Siri Ahcor